segunda-feira, 22 de junho de 2009

Idolatria e degradação de uma diva

ARTIGO

“Amy Winehouse bate em fã durante show”, “Cantora aparece com o nariz sujo de cocaína”, “Amy pode ter pouco tempo de vida”. Essas são algumas manchetes sobre a cantora inglesa que com apenas dois discos conquistou a fama, críticos e fãs ao redor de todo mundo. As notícias a cerca de seu estado de saúde e “loucura” borbulham no noticiário mundial, desde os jornais mais sensacionalistas, como os tablóides ingleses, até as tidos como mais tradicionais e corretos. Na verdade, todo esse interesse em torno da cantora evidencia uma lamentável pré-disposição da mídia em estrebuchar o possível fim de uma diva da música contemporânea e mais, mostrar como ela agoniza em praça pública.

Não é tão difícil – aliás, é bem fácil - encontrar diversas pessoas que se declaram ser fãs da cantora, mas se tivermos uma visão mais analítica veremos que idolatram não a Amy Winehouse artista, mas uma mulher tida como surtada, acreditam que ela tem um estilo de vida interessante e um dos mais controversos, que pode ao mesmo tempo bater raivosamente em uma pessoa na rua quando “der na telha” e abrir carinhosamente a porta de casa para dar o que beber e comer para os inúmeros pararazzi que fizeram morada em frente ao domicílio da cantora em Londres. “Fãs” que gostam e gostariam de ser como ela.
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Poucos tomam ciência de que não estamos falando de uma pessoa que escolheu esse estilo ao acaso para ficar na mídia, mas uma mulher doente que precisa urgentemente de ajuda, de tratamento. A atribuição de muitos do seu comportamento como “cool” preocupa, porque não tem nada de boêmio, descolado, como uma opção sombria de ser transgressora.

Ganhadora de inúmeros prêmios – entre eles cinco Grammy com o CD “Back to Black”, em 2006 -, o sinal de alerta veio quando as notícias sobre seu estado de saúde e “loucuras” se sobrepuseram as de sua tão elogiada música. “Ela esbraveja com a mesma força gospel de Aretha Franklin dos primeiros anos”, disse o jornal The Independent e sobre o disco premiado “sujo, divertido, sarcástico, abusado, auto-dilacerador, de cortar o corção e extraordinariamente sagaz e mundano” adjetivou o Daily Telegraph.


A mídia, também, fez o dever de casa. Espaços para discussão sobre suas loucuras, programas de TV que ironizam o “momento Amy Winehouse” com dublês que se agridem, quebram objetos na rua, uma cantora que baba como um cão raivoso. Engraçado em primeiro momento e preocupante se tivermos uma compreensão do que a brincadeira explicita: esse idolatrismo à degradação dos outros e a exposição ao ridículo da cantora. O ser humano tem esse seu defeito de se sentir mais forte quando vê outros fracassando. O exemplo mais notável é a criação do site “When will Amy Winehouse die?”, uma página de humor negro de apostas que premiará com um iPod a pessoa que acertar em qual data a cantora morrerá.
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Ao mesmo tempo no qual consegue ser uma das artistas mais interessantes dos últimos anos, cava a própria cova com o uso de drogas das mais diversas, da cocaína à heroína. Escândalos e solidão assistidos por milhares de pessoas que se jogam e apostam para descobrir como e quando será o fim. O jornalista Ademir Correa sintetizou todo o momento da cantora com “a sociedade fatalista ‘escolheu’ acompanhar sua queda, e não sua ascensão”, na revista Rolling Stones que traz Amy na capa.

Que sentimento é esse das pessoas quererem ver o fim trágico dos famosos? Parecem querer de alguma forma que estes escancarem que são meros mortais, assim como todos. Devemos ficar tristes por esse nosso desejo, que muitos podem defender como um dos mais humanos, que nos faz consumir esses periódicos que nos oferecem e nos fazem idolatrar não uma artista – uma das melhores – mas, ao contrário, alimenta esse lado negro de ver e acompanhar a degradação de uma mulher que tanto ainda pode fazer pela música. Algumas coisas precisam ser revistas, mesmo que Amy continue dizendo que “eles tentaram me mandar para a reabilitação, eu disse não, não, não”, como no trecho inicial de “Rehab”, uma das suas mais famosas músicas.

Um comentário:

Anônimo disse...

Interessante!